segunda-feira, 7 de outubro de 2019

A lamentável cultura do advogado 0800

Como o costume de não cobrar consultorias jurídicas e receber somente pelo êxito da ação tem varrido bons profissionais da carreira advocatícia e piorado a qualidade dos serviços de modo geral.

Estevan Facure, Advogado
Publicado por Estevan Facure
há 3 dias
16,2K visualizações
Nobres colegas de profissão ou graduandos que almejam advogar, precisamos conversar urgentemente!
Irei ilustrar um o que ocorre a todo momento com uma grande parcela dos nossos colegas de profissão, advogados.
Imaginemos que vocês, nobres leitores, são recém-formados que buscam garantir seu sustento a partir da advocacia. Imaginemos que vocês, sozinhos ou conjuntamente com colegas de faculdade e/ou cônjuges, resolvam abrir um escritório.
Queridos amigos, não bastasse a dificuldade do início da profissão, em conseguir novos (leia-se “primeiros”) clientes, ainda temos que lidar com a cultura do advogado 0800, o advogado gratuito.
Hoje, falar que cobra consultoria jurídica espanta o cliente, infelizmente. Isso se deve, ao meu ver, a falta de união da classe e isso prejudica, em última análise, toda a sociedade, explico:
Primeiramente, não vou me alongar nos argumentos mais comuns (e absolutamente corretos) de todo o tempo que você, profissional, se dedicou na graduação, além das despesas com mensalidades, livros, xerox, alimentação, transporte e etc... Além, claro, de que o tempo gasto com algo inviabiliza o tempo-gasto-com-outra-coisa, ou seja, caso você não tivesse feito cinco anos de graduação, com certeza teria investido seu tempo em outra atividade que lhe renderia frutos.
Bem, passemos ao ponto que eu gostaria de chegar, o tempo que você gasta atendendo um cliente é um tempo que não volta mais, obviamente (mas estamos inseridos em uma cultura que é preciso dizer o óbvio), então, você deixou de trabalhar durante aquele lapso temporal e deixou de fazer outros serviços, como por exemplo: elaborar petições, ir ao fórum, escrever um artigo para o JusBrasil (hehe), etc.
Diante desse cenário, é muito comum o profissional dispender (leia-se literalmente “perder”) uma hora ou mais em um atendimento que não lhe renderá qualquer fruto. Muitas vezes, ao passar o preço dos seus serviços, o advogado “afugenta” o cliente e todo o tempo dispendido durante o atendimento foi por água abaixo.
  • O mesmo pensamento se aplica à cultura do êxito.
Cliente Mélvio da Silva Jr.: “Nossa, Dr., eu tenho que te pagar mesmo se eu não receber nada?”
Essa pergunta não é absurda, doutores, o cliente não é um louco desvairado de perguntar isso. Loucos desvairados somos nós, que não cobramos consulta, que não cobramos honorários iniciais e que trabalhamos pelo êxito.
Não bastasse isso, excelências, ainda temos que lidar com um judiciário fa-li-do! Aqui em Uberlândia-MG é normal aguardar 06 meses ou mais por um despacho! Um despacho, senhores! Não uma sentença! É normal demorar ANOS para CITAR um Requerido! Esta semana completou UM ANO que estamos esperando a expedição de um alvará no JUIZADO ESPECIAL! Um ano da penhora e nada do alvará! Juizado Especial! Um ano! Tragam o bolo, velas e guaraná!
Imaginemos você, jovem advogado, com seu escritório recém-inauguradocomo você sobreviverá sem honorários iniciais? Você consegue esperar cinco anos uma sentença para começar a receber? Consegue aguardar décadas por um trânsito em julgado? Consegue se dar ao LU-XO de não cobrar consultoria? Consegue se dar ao LU-XO de cobrar só pelo êxito?
Sabemos, ainda, excelências, que muitos julgamentos são proferidos por não-magistrados (estagiários, assessores, etc.). Voltamos a falar no judiciário fa-li-do. As vezes a sua elaboradíssima petição sequer será lida pelo juiz! Talvez a sentença, depois de anos de processo, seja uma verdadeira aberração jurídica e todo o seu trabalho foi água abaixo. Você trabalhou mal? Não! Irá receber honorários? Também não! Precisamos acabar com essa cultura do receber pelo êxito! Se não deu certo, não necessariamente é “incompetência” (entre um milhão de aspas) do advogado.
É evidente, doutores, que eu estou falando da regra, e não da exceção. Se aparecer uma mulher no meu escritório, como já aconteceu, absolutamente desemparada financeiramente, vítima de uma violência patrimonial do ex-marido, eu posso sim atendê-la sem cobrar! Isso vai da liberdade de cada profissional! Minha crítica é a cultura! É a regra!
  • Como essa cultura do advogado-0800 afeta a qualidade do serviço prestado?
Volto a explanar obviedades, doutores, mas é preciso debater o assunto! Qual o ânimo de um advogado que trabalha pelo êxito? Que trabalha para começar a receber daqui 05 anos? Que sequer sabe se receberá pelo serviço prestado? Que atende de graça e doa seu conhecimento jurídico?
Você, leitor, atenderia da mesma forma um cliente pagante e outro não-pagante? Elaboraria uma petição com o mesmo zelo? Alguns diriam que sim, mas acredito que a maioria diria que não. We’re only human, after all.
No mês passado, meu querido pai fez uma cirurgia cardiaca. Imagine se ele sugerisse ao médico que só pagaria pelo êxito. O médico iria rir, certo? Pois bem...
Enfim, doutores, muitos advogados têm abandonado a advocacia por conta dessa cultura e isso me entristece sobremaneira. Precisamos debater esses assuntos mais abertamente. Precisamos expor nossas opiniões sem medo das críticas. As críticas virão, filtremos as verdadeiramente construtivas para que nós consigamos ter uma carreira em constante ascensão.
Uma carreira de sucesso a todos vocês, nobres colegas!

Espero que tenham gostado do texto!
Segue lá no insta! @estevanfg_
Se gostaram, sigam-me também no JusBrasil para ficar por dentro das próximas postagens!
Quanto a divulgação do conteúdo deste artigo: qualquer pessoa pode reproduzir o conteúdo aqui apresentado, desde que cite o autor.
Por favor, deixem suas opiniões abaixo para enriquecer o debate.
Curta nosso Facebook: www.facebook.com/lellisfacure
Site do escritório: www.lefadv.com.br
Apoiadora: Dra. Camilla de Lellis Mendonça. Advogada. Mestranda em Direito do Trabalho pela Universidade de São Paulo (USP). Especialista em Direito do Trabalho pela Universidade de São Paulo (USP). Graduada pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Membro da Clínica de Enfrentamento ao Trabalho Escravo de Uberlândia (ESAJUP/UFU) e dos grupos de estudo GETRAB-USP e NTADT-USP. Membro e Coordenadora das Newsletter Cielo Laboral.

Nenhum comentário: